C O N T E C H

BIOESTIMULADORES E BIORREMEDIADORES: DIFERENÇAS CONCEITUAIS E APLICAÇÕES NO TRATAMENTO BIOLÓGICO DE EFLUENTES

Resumo

O tratamento biológico de efluentes depende da atividade metabólica de comunidades microbianas capazes de degradar compostos orgânicos e inorgânicos presentes no meio. A manutenção da eficiência desses processos pode ser comprometida por variações de carga, presença de tóxicos, deficiências nutricionais ou choques hidráulicos. Neste contexto, o uso de bioestimuladores e biorremediadores surge como alternativa biotecnológica para restabelecimento e otimização da microbiota. Este artigo apresenta uma análise comparativa entre esses dois tipos de produtos, abordando seus princípios de funcionamento, composições, mecanismos de ação e aplicações práticas em sistemas de tratamento de efluentes sanitários e industriais.

1. Introdução

Os sistemas biológicos de tratamento de efluentes como lodos ativados, reatores anaeróbios e biofilmes aeróbios baseiam-se na capacidade de microrganismos em degradar matéria orgânica e transformar compostos nitrogenados, fosfatados e sulfurados em formas mais estáveis e menos poluentes. Entretanto, a estabilidade e a eficiência desses sistemas dependem de fatores intrínsecos (população microbiana, diversidade funcional e equilíbrio nutricional) e extrínsecos (temperatura, pH, carga orgânica, oxigenação, presença de substâncias tóxicas). Quando ocorrem perturbações nessas condições, a biomassa perde eficiência, resultando em aumento da DBO, DQO e SST no efluente tratado. Para corrigir tais desvios, recorre-se a tecnologias biotecnológicas de suporte, destacando-se os bioestimuladores e os biorremediadores.

2. Bioestimuladores: conceito e mecanismo de ação

Os bioestimuladores são formulações compostas por nutrientes orgânicos e inorgânicos, vitaminas, aminoácidos, minerais traço e fontes de carbono, nitrogênio e fósforo. Sua função principal é restabelecer o equilíbrio nutricional da biomassa e estimular o metabolismo microbiano já existente no sistema.

Os bioestimuladores atuam como cofatores metabólicos e suplementos energéticos, promovendo o aumento da taxa de respiração, síntese proteica e replicação celular. A correção da relação C:N:P é um dos efeitos mais relevantes, uma vez que esses elementos são essenciais para a construção de biomassa microbiana.

A aplicação de bioestimuladores é recomendada em situações onde há queda gradual da eficiência biológica, baixa atividade enzimática, sobrecargas orgânicas temporárias ou deficiências nutricionais. Em termos operacionais, os bioestimuladores não introduzem novas bactérias, mas aumentam o desempenho daquelas já presentes, funcionando como um reforço metabólico do ecossistema microbiano.

3. Biorremediadores: conceito e mecanismo de ação

Os biorremediadores são produtos biológicos contendo microrganismos vivos, selecionados e concentrados, geralmente na faixa de 10⁷ a 10⁹ UFC/mL. Essas bactérias — frequentemente das famílias Bacillaceae, Pseudomonadaceae, Enterobacteriaceae e Lactobacillaceae — são escolhidas por sua capacidade de degradar compostos orgânicos específicos, tais como óleos, graxas, proteínas, amidos, surfactantes e hidrocarbonetos.

A aplicação de biorremediadores baseia-se no conceito de inoculação dirigida. Ao serem introduzidos no sistema, os microrganismos colonizam o meio e estabelecem comunidades capazes de atuar em sinergia com a microbiota nativa. Essas cepas geralmente apresentam alta resistência a variações ambientais, produção de enzimas extracelulares específicas e capacidade de aderência a substratos sólidos, o que favorece a formação de biofilmes e a estabilidade do sistema.

O uso de biorremediadores é indicado em situações de perda parcial ou total da biomassa, choques tóxicos, partidas de sistemas novos, efluentes com compostos recalcitrantes ou recuperação de sistemas colapsados.

4. Discussão comparativa

A principal diferença conceitual entre bioestimuladores e biorremediadores reside no tipo de ação biológica exercida no sistema de tratamento: enquanto os bioestimuladores potencializam o metabolismo das bactérias já existentes, os biorremediadores reintroduzem microrganismos ativos para restabelecer o equilíbrio ecológico.

5. Considerações finais

A distinção entre bioestimuladores e biorremediadores é fundamental para a correta gestão biotecnológica de sistemas de tratamento de efluentes. Enquanto os primeiros atuam de forma preventiva e de manutenção, promovendo o equilíbrio metabólico da microbiota existente, os segundos têm caráter corretivo e restaurador, reintroduzindo organismos essenciais à degradação da carga orgânica.

Autor: Éverton L. Petronilho, Especialista Técnico Comercial

Referências

  • Von Sperling, M. (2017). Introdução à Qualidade das Águas e ao Tratamento de Esgotos. 4ª ed. Editora UFMG.
  • CONAMA (2005). Resolução nº 357, de 17 de março de 2005.
  • Metcalf & Eddy (2014). Wastewater Engineering: Treatment and Resource Recovery. 5ª ed. McGraw-Hill Education.
  • Madigan, M. T.; Bender, K. S.; Buckley, D. H. (2021). Brock Biology of Microorganisms. 16th ed. Pearson.
  • Bitton, G. (2011). Wastewater Microbiology. 4th ed. Wiley-Blackwell.
  • Zhang, C. et al. (2020). Role of bioaugmentation and biostimulation in the performance improvement of biological wastewater treatment systems. Chemosphere, 246:125757.

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